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domingo, 6 de dezembro de 2015

Conclusão do módulo Danças Africanas Tradicionais

por Regina Santos


Encontros e reencontros. Assim foi o módulo de Danças Africanas ao meu ver! Numa sexta feira a noite encontrei um auditório quase lotado com muito falatório, olhos curiosos e cheios de expectativa! Assistimos um pequeno vídeo sobre o significado de ritmo na cultura ao longo do continente africano, sim porque ali desvendaríamos essa cortina européia de que a África teria uma única cultura. As primeiras impressões apos o vídeo revelam nossa dissociação com essa herança em nós: " Eles têm muito ritmo". " Lá as crianças aprendem desde cedo". "Eles trabalham com ritmo, com canto e dança, né diferente da gente"... Ali nos lembramos que também temos ritmo pra trabalhar, pra andar, pra mamar, pra ninar, pra caminhar. Lembramos que as crianças aqui também aprendem desde cedo a tocar tambor, a imitar cantores e cantoras, a dançar as danças tradicionais da nossa dita cultura popular, maracatu, batuque, samba, funk...vendo assim que essa "África" esse jeito de ser nem está tão longe de nós! O encontro com a dança revelou outras limitações: " ai cansa, né?" Lá eles já tem preparo", "as pessoas são fortes, treinadas"! quase aquele lance "eles já nascem com ritmo" ou "eu não tenho ritmo viu?" E tantas outras ideias que vamos construindo. Reflexões sobre o surgimento e significado das danças, mostram trabalhadores da terra, da metalurgia, do comércio, senhoras mais velhas, crianças, pessoas gordas, enfim todo tipo de gente dançando a mesma dança, cada um com seu jeito e condicionamento. Outro vislumbre: quem codificou e disse que o canto, a música e a dança não era pra todos? Pra qualquer um? Dançar é estar junto, é mudar nosso estado físico e energético, é se expressar, rir, é viver!!!

Entre dois feriados, nos encontramos ali naquele teatro, compartilhamos histórias, reflexões, pensamentos, impressões, angústias, anseios, situações. Durante nossos encontros um menino foi assassinado no Morro do Alemão no Rio de Janeiro, discussões sobre a redução da maioridade penal inundavam as redes sociais, crianças foram barradas na escola por serem do candomblé ou por terem cabelo no estilo black power, que atrapalha a visão dos coleguinhas, terreiros foram queimados... E ali em meio a isso tudo, num lugar onde as vezes taxi nem chega, atrás de uma ocupação que virou favela, do lado das ruas onde me criei e passei a infância,  refletimos sobre nossa população afrodescendente, sobre nossa negação até hoje da marginalização iniciada com o sequestro e escravidão dessa população e o racismo e preconceito que até hoje diminui radicalmente as oportunidades desse contingente na sociedade.

Mas como nossos antepassados também nos ensinaram sempre há uma maneira de resistir, sempre há uma maneira de transformar e isso é Sobreviver! Por isso também dançamos o amor, a sensibilidade, a afetividade, a sexualidade que promove encontros e gera vida! Pouco a pouco o corpo foi se permitindo vivenciar as danças, a mente foi destravando estereótipos, frustrações e descobrimos na roda de canto, no compartilhamento das histórias de amor, de conquistas, de encontros enlaçadas em simples fios de barbantes que o fio com o passado não se perde, que ele é nosso cordão umbilical para nele adquirirmos esse poder de transformação e esperança para reescrever com nossos corpos novos passos, novas sensações. Saímos renovados e com a certeza que andar pra frente é encontrar o caminho de volta, a nós mesmos, a nossa humanidade...

De volta a região onde nasci, me criei e aprendi e admirei essas pessoas que ficaram acreditaram e mantiveram acesa essa chama para que crianças como eu fossem além-mar e retornassem. "Fui aprender a ler, pra ensinar meus camaradas" com essa frase na marcante na voz de Maria Bethânia nos despedimos na certeza de nossas responsabilidades em aprender com outros olhos, outros corpos, outras culturas, pra ensinar, melhor pra compartilharmos e nos tornarmos camaradas!!






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